Olá! Ainda bem que vieste. Porque quero contar-te uma coisa: Hoje, vi-me velho!
Não foi através de um espelho, que muitas das vezes nos retorna a imagem que o nosso cérebro constrói sobre nós. Não.
Vi-me pela objectiva de uma máquina de filmar num filme recente. E vi-me velho.
Não velho pelo cabelo branco, esse que sempre afirmo que tenho desde os 16 anos, mas que no fundo sei que a área do branco de agora, ocupa a do preto desses meus 16 anos e a restante, quase já não existe, por força da queda;
Não velho pelo espaço entre as mãos e os objectos que encurta cada vez mais e que resulta quase sempre no virar do copo cheio ou da garrafa sobre a mesa;
Não velho pelo acto repetido de tirar a gravata para almoçar, como forma de evitar sujá-la, nem da frustração de descobrir que tendo poupado a gravata, tenho de mudar de camisa;
Não velho pelo meu corpo, cujos músculos perdem cada vez mais densidade e firmeza e a luta pela manutenção dele se torna cada vez mais penosa com o passar do tempo, obtendo-se cada vez menos resultado em contraposição com o acrescer do esforço;
Não velho pelos meus amigos, que tal como eu, passam já todas as noites em casa e adormecem quase de imediato, após terem deitado o seu número múltiplo de filhos, enquanto aquele programa (de informação/debate) importantíssimo que tanto ansiavam por ver e não podiam perder, passa na televisão que está mesmo em frente ao sofá em que eles dormem, de boca aberta, sentados;
Muito menos velho pela minha mente, essa que agora considera ainda novos todos os que se situam na casa dos trinta, que afirma que o importante é o espírito jovem (sinal efectivo de que a idade começa já efectivamente a pesar) e que se orgulha pela perspicácia (que no fundo não reflecte mais do que experiência de vida) mas que não se pode dar ao luxo de dispensar a muleta do PDA, pois o que se lembra de manhã, não é o mesmo que se lembra ao início da tarde e muito menos à noite;
Não. Não falo destes aspectos que no fundo apenas agora reuni e que assim aglomerados reforçam ainda mais esta minha sensação. Não.
Vi-me velho… pelas rugas.
Não pelas rugas da pele. Essa pele na qual as mazelas deixam já marcas, na qual cada ferida demora agora muito mais tempo a curar e que também, guarda já muitas dessas marcas vincadas de expressão. Não.
Vi-me velho, pelas rugas vincadas no cansaço do olhar.
E digo-te que fiquei perplexo. Digo-te que fiquei surpreendido por não me reconhecer. Que fiquei mesmo abismado com aquele eu que estava perante os meus olhos, mas que os meus olhos não haviam ainda vislumbrado.
E neste momento penso: E tu? Como será que me vês tu?
Diz-me…