Sem
nenhum anúncio chegaste. Trazias nas mãos toda a dor do teu imenso pequeno mundo.
E com toda a força nelas o encerravas. Era só teu. Mesmo quando olhavas as mãos
vazias em dias de tempestade, e esse mundo não era mais que uma superfície
inteiramente líquida. Um mar de ausências no qual mergulhavas. Não para te
encontrares. Nunca para te encontrares. Mas para (propositadamente) te
perderes. E enquanto ficavas nessa solidão fabricada, eras sempre distância. E
frio. Para mim. Por não me conseguires conter nessas mãos, enquanto dançavas descalça
uma dança que era só tua. Sobre vidros. E desejavas que a vida não fosse mais
que um instante.
Pequeno crime.
Hoje, seguro essas mesmas mãos. Olho-as atentamente enquanto tento abrir caminho
por todos os mares. Porque sei que nelas serás sempre tu. Em qualquer lugar. Mesmo
que não aqui. Mesmo que não comigo. Porque é nelas que tu existes e onde está a
tua essência. Extensão dos teus olhos. Os mesmo que respiro. Em profundo. E através
deles viajo como um postal endereçado a um destino desconhecido. Sem importar onde
é a chegada. Porque sei que lá (sempre) te irei encontrar.
Já quis ser o teu olhar. Extremidade do teu sol.
Agora apenas quero continuar a viajar nele.
Porque hoje sei que
O meu destino
Sempre serás tu.
Num "mundo de loucos", em que as relações interpessoais muitas vezes nos "passam ao lado", vamos, com base nas nossas vivências e alguma imaginação à mistura, fazer deste cantinho um centro de reflexão e de diversão.
sábado, maio 27, 2023
PEQUENO CRIME
sábado, maio 20, 2023
CHEGAS
Esta manhã um pássaro passou. Quase longe. Voava alheio aos teus olhos. Como eu não consigo. (como eu nunca irei conseguir). E no seu voar, senti de perto o teu respirar. Peito oscilante. Realidade dos dias. E mais de perto ainda, esta fome permanente que tenho do beijo da tua boca. Em desejo. Permanente (in)satisfação. E como quem ama as palavras como a um corpo, escrevo-te. Acaricio as sílabas. Deixo que as pontuações sejam topos, e que nelas se abram portas de regresso a esse lago. Ao lugar onde és. E existimos.
Um pouco mais e será noite. Fecha os olhos e sossega. Larga as desventuras à porta do meu corpo e escuta o silêncio. Porque eu quero amar-te na palavra e no corpo. Ser o contrário de tudo o que não é de nós. E na impaciência do teu corpo, cantar-te de dentro de mim o teu nome à boca do ouvido. Enquanto te digo como um segredo, que te Amo. O quanto te Amo. E olhar-te. Olhar-te na dança e no adormecer das pálpebras. E ficar a ver-te dormir. Enquanto os beijos ainda todos na minha boca. Os sulcos das tuas unhas ainda todos na minha pele. O teu odor ainda em todos os meus poros. E ainda com todos eles, numa carícia de olhar, ansiar pelo beijo do acordar. E por isso chamar-te. Uma vez. Duas vezes. Tantas vezes, para dentro de mim. Para que não acordes. Para o mundo não te levar.
Hoje chegaste no voo do pássaro. Ontem foste brisa, som ou odor.
Nunca sei como me vais chegar. Mas todos os dias te espero.
E em todos chegas.
E nunca mais o vazio.
Em mim.
sábado, maio 13, 2023
ACORDAR
Acordo com o teu nome vindo dos meus sonhos, enquanto na
pele transpira a saudade do teu perfume, que a agitação da ausência do teu
corpo nela me provoca. É breve o instante em que o reconheço. E a vida é enorme
nesse momento. Porque assim são os meus sonhos. Pedaços de ti. Em essência. Nos
quais me aconteces em absoluto. E curiosamente sempre em silêncio. Porque não
me falas nos meus sonhos? Queria acordar sempre na tua voz, ao invés de imerso
nessa matéria efervescente de que são feitos todos os silêncios.
Mas como se as palavras queimassem a boca por dentro, nos meus sonhos não me
falas. Apenas me olhas. Em profundo. Com
esses olhos que me absorvem. E nos quais caibo por inteiro. Sem nada em
excesso. Talvez apenas os lábios. Esses que se movem para articular nenhuma
palavra. Só para os beijos que vou deixando. Em pingos. Nos caminhos da tua
pele. Enquanto na minha desenhas sem querer, em gestos que te escorregam dos
dedos, inacabados mapas invisíveis. Sem nunca me dizeres qual é o destino que
eles servem.
Seguro-te então o rosto entre as minhas mãos. E nos lábios abres um sorriso do
tamanho do medo que tenho de te perder, enquanto sinto que o dia começa a
despontar. E como se caíssem as sílabas do final de todas as palavras, a imagem
começa a perder-se. Os olhos abrem-se. E nesta hora em que as ruas estão
desertas, e também lá fora o silêncio impera, é apenas o teu perfume
aprisionado na minha roupa que me serve de ponte até ti.
Um novo dia tem início.
Os lençóis estão amarrotados.
E todo o (teu) silêncio é maior que o mundo.
E violência.
De nenhum poema.
sábado, maio 06, 2023
SOMBRAS E LUZES
Alinho as palavras que escolho criteriosamente, uma a uma, com a esperança que
elas cheguem a ti. Quero fazê-las melodia. Dar corda à caixa de música que tens
no peito. Quero que sejam pauta de orquestra. Alegria de cordas. Esplendor de
sopro. Embora saiba que nem todas as palavras são música. Nem todas notas. Somente
palavras. Letras alinhadas como estas. Algumas até só espaços. Silêncios. E eu que
não sou maestro, que fico triste com o teu silêncio, apenas tenho este desejo de
música. Em ti. Explodindo-te sorrisos nos lábios. Enquanto nos meus trauteio a
melodia do teu nome. Em segredo.
Vem. Vamos sair esta noite. Traz as mãos vazias e os braços livres. Vamos
juntos olhar a lua. Sabes que é na noite que ela mais brilha. É na penumbra que
ela melhor é conforto. Deleite. Referência. Sei que vamos olhar lados
diferentes. Mas não importa. Só assim a olharemos no seu todo. E então fala-me
desses (teus) lados. Que (só) tu vês. Fala-me das (tuas) sombras. Descreve-me
as luzes. Os cheiros que delas imaginas. E onde mais te tocam. Se nas tuas
sombras, ou nas tuas luzes. Se no teu refúgio, ou no olho da tempestade. Que (me)
és.
E depois diz-me.
(para que eu saiba o que fazer com tanto Amor)
Diz-me em qual desses lugares mais me queres.
Para eu (finalmente) saber, onde morar.