
Incorporaste em ti a figura da justiça.
Vendaste os olhos,
Empunhaste a espada,
Mas a balança não.
Falhou-te a balança.
Precisavas da mão livre para segurares as rédeas do cavalo, que mantens sempre em galope livre.
E embrenhada da tua justiça por fazer acontecer, avanças pela multidão que te cerca, degolando, decepando, fazendo-a realidade.
E de olhos vendados, sempre vendados, apenas com os olhos de um sentir que te é sombra, de um sentir que não te deixa ver para além do teu ser injustiçado, avanças… avanças sempre e sempre e cada vez mais e mais e mais. E vais. E prossegues. E não vês. Não vês que o inimigo ficou para trás e que são agora os teus companheiros de lado da batalha que mutilas. E não vês. E prossegues. És uma lutadora. Uma lutadora de vida. Impiedosa como ela sempre o foi contigo. Justa apenas para contigo, pois nunca ninguém mais o foi.
E por dentro do interior da tua armadura sangras.
Sangras as tuas vitórias que são derrotas passadas.
Sangras os teus golpes que desferes defendendo-te de ti.
Sangras um sentir com eco próprio que só tu ouves.
Sangras sobre ti e por ti.
A armadura nunca a tiras. Não sabes, mas tens medo de ti. E dentro dela a sombra guarda-se.
Por vezes baixas a viseira. No limite, tiras o capacete. Mas nunca mais do que isso. Sem ele respiras outro ar e chegas a pensar… ser possível. Mas logo dentro de ti uma nova batalha se despoleta, nessa guerra que te é a vida. Por vezes, é apenas o silvo do vento. Por vezes, ecos de batalhas de outros, mas que tu, logo fazes tuas. E corres a montar o teu cavalo. E maldizendo a vida e a sorte, empunhas de novo a espada (muitas das vezes ainda não limpa da batalha anterior).
E não vês.
Não vês que a espada que carregas és tu. E a guerra que travas é a tua vida.
Não tens descanso.
E fazes-te grande perante o mundo, mas pequena perante ti.
E és em ti mesma,
A própria justiça injustiçada...
...à espera de ser feita.