Injustiçada pela vida,
Incorporaste em ti a figura da justiça.
Vendaste os olhos,
Empunhaste a espada,
Mas a balança não.
Falhou-te a balança.
Precisavas da mão livre para segurares as rédeas do cavalo, que mantens sempre em galope livre.
E embrenhada da tua justiça por fazer acontecer, avanças pela multidão que te cerca, degolando, decepando, fazendo-a realidade.
E de olhos vendados, sempre vendados, apenas com os olhos de um sentir que te é sombra, de um sentir que não te deixa ver para além do teu ser injustiçado, avanças… avanças sempre e sempre e cada vez mais e mais e mais. E vais. E prossegues. E não vês. Não vês que o inimigo ficou para trás e que são agora os teus companheiros de lado da batalha que mutilas. E não vês. E prossegues. És uma lutadora. Uma lutadora de vida. Impiedosa como ela sempre o foi contigo. Justa apenas para contigo, pois nunca ninguém mais o foi.
E por dentro do interior da tua armadura sangras.
Sangras as tuas vitórias que são derrotas passadas.
Sangras os teus golpes que desferes defendendo-te de ti.
Sangras um sentir com eco próprio que só tu ouves.
Sangras sobre ti e por ti.
A armadura nunca a tiras. Não sabes, mas tens medo de ti. E dentro dela a sombra guarda-se.
Por vezes baixas a viseira. No limite, tiras o capacete. Mas nunca mais do que isso.
Sem ele respiras outro ar e chegas a pensar… ser possível. Mas logo dentro de ti uma nova batalha se despoleta, nessa guerra que te é a vida. Por vezes, é apenas o silvo do vento. Por vezes, ecos de batalhas de outros, mas que tu, logo fazes tuas. E corres a montar o teu cavalo. E maldizendo a vida e a sorte, empunhas de novo a espada (muitas das vezes ainda não limpa da batalha anterior).
E não vês.
Não vês que a espada que carregas és tu. E a guerra que travas é a tua vida.
Não tens descanso.
E fazes-te grande perante o mundo, mas pequena perante ti.
E és em ti mesma,
A própria justiça injustiçada...
...à espera de ser feita.
7 comentários:
Injusto é sempre que cá venho não conseguir deixar um comentario. Confesso-te passo por cá todas as vezes que ligo o computador e, quase sempre, vou embora em silencio. Repito as mesmas leituras vezes sem conta, e nunca me canso.
Apesar de não saber bem o que te dizer, sei que hoje não posso partir em silencio. Senti-me muito perto das tuas palavras, embalada pelas tuas pontuaçoes.
Escreves tão bem que chega a doer.
Um beijo*
De mansinho ouso sair da cabana. O vento frio não se faz sentir. O horizonte aparece-me limpo e o terreno em cinzas de Inverno. Ouso dar um passo mais em direcção ao labirinto. Entro? Fico? Avanço! Decidido e forte. Sei da inquietação que ficou dentro da cabana, onde ela ainda dorme no cheiro daquela noite. Tenho de me afastar. Nem olho para trás, claro. A porta ficou aberta para deixar entrar as minhas lágrimas. Que da saudade só conheço a poesia. E da dor o carregado corpo com que me transporto. Mais morto que vivo, é certo. Tenho de avançar. A viagem é longa longa quem sabe eterna... Levanto a cabeça por sobre as estradas de terra desenhadas a carvão. Ergo as mãos sobre a cabeça. Quero arrancar-me um pedacinho que seja desta ausência. Vou. Porque só assim saberei ficar...
Amei este teu texto!
um abraço quentinho
Obrigada pela visita e pelas palavras!
Não conhecia o blog, mas fiquei fã!!!!
Já li alguns textos, mas assim que tiver mais tempo irei ler todos!!
Adoreiii..
Beijinho*
Passar por aqui não é ritual mas, sim, necessidade; necessidade de te ler, de tentar acompanhar o teu pensamento. Tal como a Gaivota, muitas são as vezes que passo e me sinto completamente despojada de qualquer palavra que mereça estar escrita neste teu sítio.
Bjt
Assim se travam lutas intermináveis entre as fronteiras da razão e das mãos que carregam o peso das tarefas sempre inacabadas.
Beijo
E do alto da sua armadura de justiceira... que de tão dormente não sente, a lâmina da espada a esvair em sangue a sua própria pele... que de tão cega não se permite receber as dádivas de cada dia... que sempre lhe pesam leves, na insaciável balança, de sua justiça.
Beijinho meu
*
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