Dois dias depois, o teu prato continua na mesa.
Em tempo futuro, o mundo continuou a acontecer. Na normalidade dos dias. Essa que não vemos. Nunca vemos. Que na certeza da sua sucessão, chegamos a, por vezes, até os ignorar. Menosprezar. De alguns desejar supressão. Paragem. E que agora são dor. Saudade. Vazio. Falta.
Quero manter-te em mim em calor. E na avidez dos sentidos procuro por ti. Tua voz. Olhar. Sorriso. Aconchego de abraço. Coisas de ti. Simples. Em dádiva. Como sempre Tu. Sempre aqui. Não mais aqui. E incessantemente chamo por ti. Procuro-te assim. Percorrendo os mesmos passos mas caminhando de costas. Pois sei que só no tempo passado te encontro. Quando o possível era a norma. Quando éramos felizes e não o sabíamos. Sonhávamos a cores. E estavas aqui. E o prato tinha utilidade.
Agora, todas as coisas têm o teu nome. Invocam-te. Vejo pedaços de ti
em tudo.
Dir-te-ia se pudesse que sou mais teu pai que
nunca. Que te sinto como nunca. Ou como sempre. Sem então o saber. Que a tua
mãe fez a tua comida favorita e não conseguimos comer. Ficou na mesa. Em
silêncio. Ao lado do teu prato. Esperando que te servisses primeiro. Como
sempre.
Dir-te-ia se pudesse. Mas palavras são agora mudas. Gritam dentro. Apenas eu as
ouço. Em estridência.
Dois dias depois foi há dois meses. Dois anos. Não sei. O tempo tem agora outra medida. Todo ele me parece excesso. Conto-o ao contrário. Não em soma. Em réstia. Em medida para o reencontro.
E o teu prato continua na mesa. Em ausência.
Como Tu. Que não estás.
Como nós. Que apenas existimos.