segunda-feira, julho 27, 2009

Curtas 23 - Hoje


Desde que te conheci sempre foste igual a ti mesmo, até ontem.

Um peito que albergava todos. Um sorriso que nos abraçava. Sentia que naquele teu sorriso podias abraçar o mundo inteiro, sabias? Concentrar nele toda a existência de todas as coisas, sem que para isso sequer te esforçasses.

Era inato. Fazia parte de ti.

E os teus braços... o calor do teu abraço... eram um porto de abrigo para quem te procurava. E não eram poucos os que te procuravam. E os teus braços sempre disponíveis para todos. Até para os que notoriamente não o mereciam e que mesmo sabendo tu disso, não deixavas de os oferecer, assim, de forma tão absolutamente gratuita, como se do teu melhor amigo se tratasse. Se é que o tinhas. Porque nesse teu imenso dar, nessa tua tão grande dádiva de ti próprio para com os outros, poucas vezes vi um retorno na tua direcção. É verdade. Mas a tua naturalidade na dádiva era tão grande, que muitas vezes me “recriminei” a mim mesma essa opinião, porque achava ser impossível que assim fosse. Não podia mesmo ser assim, pois caso contrário não estarias sempre tão disposto para os outros…

Hoje sei que tal não é verdade!

Hoje compreendo aquele teu olhar preso no infinito em que algumas vezes te encontrei, como que procurando algo no horizonte. Como que esperando algo que viesse dali e só dali fosse possível vir.

Hoje compreendo-te. Hoje sei o que fazias com esse olhar. Procuravas.

Hoje sei que o calor da brisa te era algo absolutamente necessário à tua própria existência, pois nela encontravas o que tantas vezes precisavas e não conseguias obter por outros meios, de outra forma ou a partir de outras origens materializado em algo diferente. Hoje compreendo que era no abstracto que encontravas tantas vezes o teu complemento, por não ser possível teres esse complemento a partir do que te rodeava. Hoje sei.

E no fundo, acho que nunca te compreendi em pleno. Se calhar a culpa nem é minha. Se calhar, como tu tantas vezes dizias, nem sequer há lugar a culpa. Não é possível conhecer o que se desconhece. Não é possível conhecer o que é inalcançável. E muitas coisas, é preciso senti-las para as conhecer e só depois tentar compreender. Mas tu eras único. Tu tinhas sentimentos e atitudes, muito teus, muito próprios. E muito difíceis de compreender e aceitar.

Hoje, acho que apenas tu te poderias compreender a ti próprio em pleno.

Hoje, acho que não fiz tudo o que poderia ter feito para te compreender e agora vejo que afinal, até era tão fácil... bastava aceitar as tuas palavras… sem reservas. Porque tu não tinhas reservas nas palavras. Também nelas eras dádiva. Através delas fazias dádiva. E tinhas uma quantidade enorme delas, sempre prontas, sempre em fila para a saída. Sempre dispostas àquelas horas que pareciam não acabar, nem que por isso, tivesses de seguida de entrar noite dentro para terminares a tarefa que tinhas em mãos.

Hoje, gostaria de te dizer que finalmente te compreendo.

Hoje, gostaria de te demonstrar que posso aceitar sem reservas as tuas palavras.

Hoje, gostaria de te dar, nem que numa pequena parte, tudo aquilo que sempre me deste e dizer-te o quanto me arrependo de durante todos estes anos não ter sido capaz de o fazer.

Mas hoje... hoje é tarde Meu Amor. Hoje já não to posso dizer. E sei que estas palavras vão para sempre ficar presas em mim.

E hoje...
Hoje eu só espero, que leves guardado em ti, não as minhas palavras, mas os melhores momentos de Nós.

Renasces em mim!

- “Podem fechar o caixão.”

quarta-feira, julho 08, 2009

Curtas 22 – “Aquele nosso mundo”


Meti pela última vez a chave na porta daquele que era o nosso mundo. E naquele momento houve algo que mudou em mim.
Como se sentisse a chave entrar de uma forma diferente;
Como se o barulho que a mesma fazia na sua progressão tivesse outro tom;
Como se a fechadura fosse mais larga;
Como se oferecesse menos resistência;
Como se uma camada de ar revestisse a chave e a auxiliasse no seu caminho por entre os pinos da fechadura que pareciam não se quererem contrapor aos dentes da chave;
Como se houvessem menos obstáculos ao acto em si;
Como se a mão que empunhava a chave não fosse mais a mesma, ou o corpo que a suportava não tivesse mais os mesmos sentires…

Meti pela última vez a chave na porta daquele que era o nosso mundo, e entrei no lugar que não era mais teu. Estava vazio de ti. Levastes-te para sempre dali, arrancando-te de mim à força como um vendaval que passa e arrasta consigo os haveres. Os teus haveres. Todos os teus haveres que levaste contigo, deixando no lugar deles o silêncio dos espaços vazios. O vazio dos espaços em silêncio.

Aquele nosso mundo que agora não era mais teu, era o lugar onde o silêncio se havia perdido e estava espalhado e derramado e impregnado por toda a casa. Não havia ruídos de ti. Não havia mais do que as memórias dos ruídos de nós. Não se faziam ecoar nas paredes mais do que os meus gritos mudos, que em segredo lançava para dentro de mim e me arrancavam as minhas certezas mesmo das minhas mais recônditas profundezas.

Aquele nosso mundo não era mais teu.
E aquela casa era eu.
Vazia de ti.

E lentamente sucumbi…
…para dentro de mim…
…ao sabor da minha implosão.

quinta-feira, julho 02, 2009

Texto para uma imagem

Curtas 9 - Desde sempre


Desde sempre soube que um dia serias meu.
Desde a nossa infância, sempre senti isso, no mais fundo de mim sem nunca to ter dito, porque isso, para mim, era uma certeza.

Eu fui acompanhando o teu crescimento, fui acompanhando os teus casos, os teus sucessos, os teus fracassos, sempre com essa convicção, de que um dia serias meu.

E em cada volta, com o fracasso de mais um caso, eu pensava: “será agora?” Mas não! O agora teimou em tardar e o tempo foi passando.
Passando tanto que, de repente dei por mim a pensar que, o tempo havia passado e que a nossa oportunidade se havia perdido, algures, nos meandros das nossas vidas.

Lembrando-nos, lembro-me das noites que dormimos lado a lado, das nossas conversas, dos nossos afagos e penso… penso que nunca me terás visto como a mulher que sempre fui, cujos poros pulsavam por ti, cujo corpo te esperava no silêncio do desejo.

Agora pedes-me… Agora dizes-me… Que me queres… Que concluiste que sempre tiveras a teu lado a pessoa certa mas que nunca me viste…

Não sei como devo interpretar isto mas… também não quero!
Quero-te como sempre e desde sempre e por isso, não vou perder tempo a filosofar.

Vou abraçar-te, dizer-te, mostrar-te o quanto desde criança eu te quero e te desejo, fazer-te ver finalmente, porque nunca conseguiste uma relação com outro alguém, pois estavas predestinado para mim.

Sabes, hoje, à distância de todos estes anos, ainda nos consigo ver… no leito das nossas sestas, no qual quero, contigo ficar… Sempre!

Amo-te!

terça-feira, junho 16, 2009



Cheguei para sempre a este lugar que és Tu.

Descreve-me agora
Como se eu fosse possível de existir sem ti

Porque eu já não sei falar-me,
Sem dizer-Te.


segunda-feira, junho 08, 2009

"Desafio"

A Nuvem (do blog A minha Nuvem) a propósito do tamanho dos meus textos (a que chamamos de lençóis) vs. os dela (que por comparação, passamos a chamar de "fronhas de almofada"), um dia escreveu-me isto:

"Brain, um dia desafio-te a escrever uma "fronha de almofada" das minhas, e eu prometo tentar escrever um "lençol" dos teus :) Beijinhos”

Daí "nasceu(-me)" a ideia de cada um, a partir de uma imagem utilizada num texto do outro, fazer "a sua versão", sendo que eu teria de escrever uma "fronha" e ela um "lençol".

O acordado foi que aqui eu colocaria o texto dela, seguido do meu texto.
E no "A Minha Nuvem" ela faria o mesmo.

Aqui ficam então eles:


NO SILÊNCIO DO TEU TOQUE (por Nuvem)

Quero-te.

E é no silêncio do teu toque
que te digo que sou tua.

Digo-to com os meus olhos
rasgando o mar dos teus olhos,
e os meus lábios, segredando
as marés dos teus cabelos
que ondulam nas minhas mãos.

Digo-to sem falar,
porque entre as nossas bocas
as palavras já não têm espaço...

Digo-to com a minha pele
respirando ávida nos teus dedos,
como se fosse morrer no segundo
em que deixasses de lhe tocar.

Sinto-te como o vento,
percorrendo cada recanto meu
como se sempre tivesse sido a sua casa,
como se me conhecesse
mesmo antes de eu saber que existia.

Houve um dia em que eu não era tua.
E tu também não eras meu.

Um dia em que vento e mar
eram só palavras vazias para mim.
Um dia em que o mar e o vento
não me conheciam.

Um dia em que os meus olhos
não sabiam navegar,
e os meus lábios padeciam de sede
sem saber...

Um dia em que o meu corpo
não tinha janelas.

Sim, houve um dia,
um dia muito distante,
um dia que já não sei lembrar,
em que eu não sabia que tu eras vida
e mar e vento e tudo o que há.

Hoje só sei ser tua.
(Como a espuma pertence ao mar,
como as janelas se abrem ao vento.)

Só sei querer-te.
(Como o coração quer a vida
que pulsa a cada segundo dentro dele.)

E digo-to no silêncio do teu toque,
sempre que os meus olhos
são os teus olhos e os meus lábios
são segredos que se perdem
nos teus cabelos,
que se perdem nas minhas mãos...


DESAFIA-ME (por Brain em 2007.04.30)

Desafia-me!
Tira-me do sério,
Obriga-me a uma loucura,
Leva-me a uma superação de ser.

Espicaça-me!
Vira-me do avesso,
Arrepia-me os sentidos,
Revela-me as entranhas.

Tenta-me!
Faz dos teus lençóis o meu chão,
Do teu corpo o meu alimento,
Do teu suor a minha água.

Surpreende-me!
Leva-me por um caminho sem rumo,
Tira-me as direcções,
Atira-me ao ar sem rede,
Obriga-me a cair de pé.

Desafia-me,
…a mente!

Espicaça-me,
…os sentidos!

Tenta-me,
…a pele!

Surpreende-me,
…os sentimentos!

(Tira-me desta letargia!!!)


(Resta-me agradecer-te Nuvem o carinho da partilha. Do fundo de mim, um Beijo meu)

quarta-feira, maio 27, 2009

Finalmente a noite


Abri os braços.
De mãos abertas estendi-te os dedos e como quem se despe por dentro disse-te que entrasses.
Entrasses tão cheia desses teus nadas que te prendem aos dias.
Que viesses com tudo isso que de ti te faz.

E em segredo, disse-te que ficasses.
Que nada precisavas fazer ou sequer falar.
Que te bastava apenas isso: ficar.

E tu vieste.
Tu vieste e sem que eu o soubesse, trouxeste contigo, materializado na ponta dos teus dedos o meu desejo.
Foste a pouco e pouco, com os teus sons e odores preenchendo espaços de mim.
Espalhaste as tuas raízes pelos meus sentires e tornaste-te Tu em Mim.

E eu assisti.
Eu assisti à tua lenta mas progressiva e decidida ocupação.
Eu assisti e fui-te abrindo frestas. Indicando-te caminhos escondidos e escorrendo-te em mim.
E letra a letra, fui gravando o teu nome dentro da pele para que não o pudesses ver.
E com isso, sonhei que para sempre ficarias em mim.
Sonhei que para sempre me acompanharias no meu percurso até ao infinito.
Que para sempre serias sede e água. Serias fome e alimento.
Serias mais tu em mim do que eu, por eu ser mais tu em ti do que tu.

E por fim aprendi.
Aprendi que para sempre é muito tempo.
Que para sempre não existe, tal como não existiam espaços vazios na tua imensidão para me gravares em ti, sequer por dentro das linhas da tua mão.
E dou por mim a desejar que me tivesses levado contigo, agarrado ao silêncio da tua voz, nas voltas sem dormir de tanto me quereres abraçar dentro desse teu refúgio (secreto).

E tu sempre foste segredo.
Tu sempre foste frio na noite e medo no escuro. Palpites de incerteza no meio da estrada.
Esperança de alguém te encontrar, sem contudo com ninguém quereres ficar.
E agarrando-te à tua desculpa das tuas mãos vazias, nada nunca de ti deste (para que não te conhecessem), mesmo quando fixavas o teu olhar no meu ficavas sempre longe de nós, dentro de um lugar desejado para lá do teu disfarce.

E no repente da memória do momento de um Beijo,
O toque ao de leve do fundo de uma saudade,
Quando olhando-me em silêncio no fundo dos olhos
Me encheste a alma com palavras de Ti,
Presenteando-me a existência com o teu ser,
Que de tão de mim feito existiu,
Que nos teus olhos se reflectiu,
E me fez assim, acontecer.

Hoje, procuro no infinito um sinal de ti.
Procuro no silêncio do horizonte um sinal teu de vida em mim.
Tento sentir na brisa um sussurro do teu peito enviado em direcção ao meu.
Tento sentir dentro de mim uma réstia de calor teu: em palavras que ficaram por dizer; no segredo húmido dos meus olhos.

Mas hoje não te encontro.
Já não te encontro.

E é quando então,
Finalmente,
A noite acontece.

quarta-feira, maio 06, 2009

Sabes


Sabes que o olhar me diz muito.
Sabes disso e sempre fizeste questão em me desafiar com o teu.

Sabes que os odores mexem sempre comigo.
Sabes disso e sempre fizeste questão em deixar os teus impregnados em mim.

Sabes que o toque me faz vibrar.
Sabes disso e sempre me cravaste as unhas, quando a dois éramos um.

Sabes que os sons me dizem muito.
Sabes disso e sempre tiveste o cuidado de me deixares os teus, bem perto dos meus ouvidos.

Sabes que há imagens que me perseguem.
Sabes disso e sempre fizeste questão de mas querer mostrar.

Sabes que nunca tive uma imagem límpida de mim mesmo.
Sabes disso e sempre fizeste questão em me manter no turvo do meu ser.

Sabes que o silêncio sempre foi meu inimigo.
Sabes disso e sempre fizeste questão em me ferires com o teu, sempre que me querias atingir.

Sabes que a distância física a mim não me importa, desde que não te sinta distante.
Sabes disso e tantas vezes juntaste uma à outra, para me atirares para dentro de mim.

Sabes tantas coisas sobre mim…
Ao ponto...
...de não me conheceres!