Tu não sabes Pai, porque eu nunca te disse.
Não sabes dos meus dias infinitos. Das dores negras. Maiores. Insensíveis. Partes de mim que desconheço. Das dores fora de mim. Por vezes, doem-me as paredes. Em espasmos de cal. Luz fulminante. Raio sem trovão. Coisas de existir onde não estou. Nunca te disse do negro do medo. Este medo que tantas vezes me faz. Me é. E no qual eu (me) sou todo. Só. Medo. Há sementes plantadas em mim. Em explosão. Há corpos e vozes dentro de mim. Indomáveis. Em sustos descontrolados. Tenho as mãos, os pés, e por vezes não sei o que fazer com eles. Não ando. Dói andar. Não penso. Dói pensar. Em esgar. Em profundo. Nunca te disse que os meus olhos me mostram coisas em privado. São únicas. Minhas. Só deles. Corredores arqueados. Escadas em movimento. Pequenas trevas. Há o chão, o tecto, mas a ordem não é essa e eu também não tenho ordem. Sinto-os respirar. Vibram a cada inspiração e eu tento agarrar-me. A eles. A essa respiração que cumpre a minha. Que eu já não a consigo sozinho.
Tu não sabes Pai, porque eu nunca te disse.
Não sabes que vivo em contínua procura de mim. E cada passo dado é em direcção a ti. Para me encontrar, é a ti que procuro. A cada dor, é a ti que procuro. A cada delírio, é a ti que procuro. A cada não, é a ti que procuro. Em silêncio. Sem palavras. Por vezes, mesmo sem te procurar. Em espelho. Para (te) me ser. Mas vive alto o teu olhar. É longe o teu chão. E tu não estás. Tu nunca estás. E eu nunca me encontro. E permaneço.
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