Posso dizer-te que já não me és. Que já não te quero. Que já não te tenho em mim. Que o tempo apagou todos os teus traços e que o meu corpo já não tem memórias de ti. Que a tua voz já me é estranha. O teu toque já só me é sombra. Passado. Que tudo o que é meu nada tem de ti. Que o meu cio já não te pertence. Que os meus arrepios são apenas meus. Que sem ti sou maior. Mais que tu. Muralha. Alta. Forte. Blindada. Mas as janelas...
Há janelas que por vezes se abrem para te deixar entrar. Em jorro. Avalanche. Tudo num único instante. E tudo então é mentira. Ardes-me em cada ruga de pele. Em cada vinco de poro. Nos lábios nus. E procuro-te incessantemente. Desejo-te. Quero-te. Não importa como. Inteiro, ou aos pedaços. Com todo tempo, ou a tempo contado. Em imagem, ou apenas em som. Desde que na pele. Na noite. Sobre mim. Dentro de mim. Porque só tu me estremeces. Só tu me fazes líquida. Animal. Urro. E grito. Só tu tens nas mãos o poder do tempo. Em que somos. Em que me fazes. Em que nada mais.
No egoísmo de te querer inteiro, perdi-te. E tudo o que tenho agora é esta luz. Este vazio a que me agarro. Silêncio onde me sangro. Me perco. Definho. Tenho medo de saber mais do que sei. Porque não te quero saber noutra. Não te quero saber noutro corpo. Noutra pele. Noutros gritos. E does-me. Mas eu quero-te nesta dor. Em espinhos. Em sangue. Desde que teu. Desde que só meu.
A luz já só me queima. Calcina-me as entranhas. Mas seguro-a com toda a minha força. Agarro-a. Faço-a tudo de mim. Porque ela é tudo o que me resta. De ti. E eu, que não te posso perder de mais nenhuma forma, aprisiono-a. No meu corpo.
Até que tu. Numa dor de cada vez.
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