Nada
em mim cresce agora. Distraído com o passar dos dias, não me apercebi do início
da queda. Nem das folhas que indicavam que o tempo estava já magoado. O outono
chegou e eu continuava. Feliz. A cantar as promessas da primavera. A esperar os
sonhos do verão. Como quem ignora que os sonhos podem ser feridas que não
cicatrizam nunca. Permanecem sempre abertas. Que nos levam consigo ao lugar
mais profundo de nós. De onde tantas vezes queremos fugir. Achando que por
simplesmente o ignorar ele deixa de existir. Quando nele todos os dias se morre
um pouco. Do seu silêncio.
Quero hoje o teu Olá. Bate à porta do meu corpo e diz-mo. Como sempre o fazes.
No fim do primeiro beijo. Mente-me que me queres. Mais uma vez. Diz-me que não tens
horas para voltar e que noite será nossa. Para sempre. Que os retratos sobre a
mesa irão ser os nossos. E que será sempre o teu, o perfume na escada. O som
dos passos que a percorrem. Eu saberei que não é verdade, mas guardá-lo-ei no lugar
dos sonhos. Como segredo. Como quando chamas pelo meu nome para dentro do teu
corpo. E eu deixo-me ir. Em desejo.
Pergunto-me agora se é assim me despeço de ti. Longe dos teus olhos. Onde está sempre
frio. E são agora as minhas mãos que me despem das vestes. Substituindo as
tuas. E o teu nome vagueia rente aos meus lábios. Quase sempre por dizer. Numa
quase dor. Na qual aguardo provavelmente o teu regresso. Secretamente. Aqui. Onde
é a noite que agora me morde a pele. E me pergunto se o meu nome ainda é
articulado em alguma parte do teu corpo. Ou se ele já o esqueceu. Desfigurado. Pelo
cansaço de todas as esperas.
Nada em mim cresce agora.
Doem-me os dedos sobre as palavras.
E sou consciência, que o inverno chegou.
Num "mundo de loucos", em que as relações interpessoais muitas vezes nos "passam ao lado", vamos, com base nas nossas vivências e alguma imaginação à mistura, fazer deste cantinho um centro de reflexão e de diversão.
sábado, junho 10, 2023
NADA EM MIM
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