sábado, fevereiro 24, 2024

DEIXA QUE TE AME SEM PALAVRAS

Deixa que eu te ame sem palavras.
Encontro-te nos meus lábios imensa de tudo o que não tenho. Um simples deslize entre o pouco e o nada. Acompanho-te no suspiro fundo que me colas ao rosto. Enquanto encaixo devagar na curva dos teus desejos. E toda uma prosa selvagem corre solta para ti. Sem palavras. Com sede de tudo. No silêncio dos teus sentidos a segredar o toque dos meus. Em todos os instantes em que me esperas. E toda me recebes. E me bebes até à última gota de sol.

Digo-te: Há flores que dependem de ti.
E tu guardas esta minha confissão com a chave da tua boca. Enquanto esmagas as palavras com o teu olhar denso. Com impronunciáveis emoções. E me guardas. E me demoras em ti. Com a inexatidão de um desejo anunciado que ferve na alma. Com o meu nome a escorrer em cada veia. Com as marcas invisíveis de um tempo sem medida.

Quando foi que as tuas mãos se cruzaram com as minhas e ficaram?
Quando foi que começaram a sorrir em silêncio?

Estão ainda húmidas as toalhas que nos secaram os corpos depois do Amor.
Estão ainda húmidos os lábios que acolheram o calor dos teus.

Porque todos os teus beijos são eternos.
E nunca morrem na minha boca.
Em nenhuma palavra. 

sábado, fevereiro 17, 2024

CASA

Permanecemos aqui. Nesta casa em que nos sendo, não nos diz.
Casa com paredes de silêncio. Chão aberto ao tempo. E tudo aquilo que jamais será dito. As portas que se fecham atrás da tua sombra. E a partilha de todas as nossas ausências. Que fazem todos os vazios. Dos toques inexistentes da tua mão na minha. Do silêncio da tua voz do outro lado de nenhum telefone.

Quando foi que o universo deixou de ser perfeito?
Talvez apenas um segundo. Ou apenas um pouco mais. Mas permanecemos no foco. Porque luz nenhuma se divide para a (sua) partilha. Existe única. Sempre. Com toda a (sua) intensidade. E por vezes fere. Outras vezes, sangra. Faz-nos golpe da própria luz. Invade todos os oceanos. E revela. Todos os lados abertos. Dessa tua porta fechada.

Sou tábua inerte de algum naufrágio.
A cada noite repetida sem lua.

Em que nenhuma água se agarra ao teu corpo.
E tu. Não te agarras ao meu.

 

sábado, fevereiro 03, 2024

DUELOS DE AMOR

Nos olhos parados damo-nos conta do silêncio.
São assim os momentos que antecedem todos os abandonos. Únicos. Ínfimas frações de tempo.

Os dedos trauteiam desejos na vénia de uma carícia lenta. Os cabelos enleiam-se no hálito. As respirações cruzadas captam o olhar que se fecha. - Pequenas rendições ao quente que espalhamos no ar que nos envolve.

Prendem-se os gestos ao desassossego que reina debaixo da nudez. E já somos nada em controlo. Nesse teu beijo que é o molde do meu. Nas bocas famintas que se molham. Que se bebem. Se procuram e se necessitam. Nelas arde esse fogo por dentro. Que inflama todas as lutas. No enrolar solitário das línguas no desejo.

Incendeiam-se os corpos numa paixão duplamente enfurecida. Na qual matamos o anseio numa quase raiva estonteada que nos atravessa. Confunde. Ficando sem saber se é a tua paixão enfurecida que se esvai no meu desejo, ou se é o teu desejo que enlouquece a minha fúria de paixão. Nelas somos sempre inteiros. Até nos raros momentos que em palavras rasgamos o silêncio. Dizendo-nos.

Silêncio e Tempo.
Entrega e (des)Ordem.

Duelos de Amor.

sábado, janeiro 27, 2024

ESPERA

A vida é tão pequena.

O vento viaja por todos os muros. O mar salga todas as praias. E a solidão é tão grande.

Vivo em permanência por trás desta porta à qual passos nenhuns teus se dirigem. Deito-me em escuridão nesta cama e penso palavras com os lábios. Pronunciam-te. De olhos fechados pergunto-me por onde vagueia a tua sombra. E tenho medo, sabes? Medo de te saber noutro lugar. Medo de te saber com outro alguém. Saber-te que não aqui, por tua vontade.

 

A vida é tão pequena.

O vento viaja por todos os muros. E a estrada está a ficar demasiado longa.

Tenho a casa vazia. Quero ir-me embora. Mas não me movo. Permaneço neste carrocel. Com medo que venhas e não me encontres. Me percas por um segundo de vida. Chegues e eu não esteja aqui. Onde as horas já são tantas. Onde me deito nesta escuridão. Os meus lábios pensam palavras que te pronunciam. O teu nome é uma palavra demasiado funda no meu corpo. E todos os teus beijos vão azedando, um por um, na minha boca.

 

Nenhum espelho aqui lembra já o teu reflexo.

 

Talvez te vá encontrar noutro lugar.

Talvez te vá encontrar com outro alguém.

E o teu silêncio vá ser maior que o mundo.

E apenas consigas dizer o meu nome com os teus dedos.

Quando tocarem a tua pele. Em todos aqueles pontos onde já não os meus.

(há tanto tempo que já não os meus)

 

E então, saberei.

sábado, janeiro 13, 2024

NEM TUDO ESTÁ DITO AINDA

Não. Nem tudo está dito ainda.
Há várias páginas em branco por preencher. Páginas desprendidas que a carne não escreve. Exaltação de fogo que nem os olhos, nem as mãos, nem a razão conseguem dissolver no meu tempo sem ti. Calor insatisfeito na sede de tudo e de coisa nenhuma. Que guardo num espaço que só se abre com a chave da tua boca. E com as metades de cada um de nós, faço um filho às palavras. E espero que cresça. Até à prosa selvagem. A correr à solta. Sob o olhar atento dos teus sentidos. Sem o toque dos meus.


Talvez as palavras que desassossegam as entrelinhas rasguem (todos) os verbos.
Talvez essa carícia que me afaga os sonhos seja precisamente o instante onde me esperas. Onde me fazes sentir que sabes o que sinto em mim. Num tempo sem medida. Onde me és. Como um dia inteiro que acontece num fim de tarde. Pois nunca a ausência dos teus lábios foi a forma de esquecer o que não foi pronunciado. Naquela tua voz. Onde sobra o desejo. À qual sempre chego a ti sem saber o que me acontece ao corpo. Que abre a janela e voa. Cai no chão e chora. Sangra e gosta. Ri do meu silêncio. Faz-me os gestos. Na fuga em que tudo volta. E me chama. Uma vez mais. A ti.

Não. Nem tudo está dito ainda.
Há várias páginas em branco por preencher.

Deixa a porta entreaberta. Apaga a luz.
E grita bem alto o meu nome. Em todos os teus silêncios.

sábado, janeiro 06, 2024

SONHO DE TE TER

Sinto-te permanentemente em mim.
Como chocolate quente que derrete sob o meu corpo e adquire as minhas formas, envolves-me. Ferves(-me). Despertas-me de uma forma única que não sei dizer. Não há como. Quero ser a tua pele. O sangue do teu pulsar. Ser parte de ti. Em prolongamento. Em necessidade. Renascer permanentemente no conforto dos teus lábios. E como uma seiva de ti, quero beber da tua boca todas as palavras que resgatas dos ecos interiores da tua pele. Em sussurros. E deixas espalhadas pelo meu corpo em murmúrios de língua. Depositadas nos poros adocicados de ti.

Com o brilho da ânsia no teu olhar, entro em ti como quem entra em casa.
As tuas pernas o abraço de boas-vindas e o teu peito o sorriso que olhando nos olhos me diz: o teu lugar é aqui! Ouço os sons do teu corpo em ecos dobrados de suspiros e murmúrios de querer-me. Esses que não consegues conter de todas as vezes que me perco em caminhos de ti. Em expedições de anseios e desejos cúmplices. Na densa procura de novos pulsares. No êxtase de um céu em chamas que te sussurro ao ouvido. Envoltos pela mistura de odores que de nós emana. Numa mistura única e nossa. Reinventada de cada vez que fazemos Amor.

Nesta força de existência, transporto nas minhas mãos pedaços da tua essência.
Nas palavras (cheias de ti) frases que me fazem fervilhar as veias. Numa perdição profunda que faz tremer a pele na simples ideia da tua.

E é neste espaço encravado entre o tempo que voa e aquele que pára.
Entre a eternidade e o instante que passa.
Que eu vivo. Intensamente.

O sonho de te ter.

sábado, dezembro 16, 2023

CAOS

Como sentir este momento?
Dedicaste a vida a produzir cor. De uma forma ávida distribuir beleza. E num repente partiste. E agora o universo inteiro parece uma tempestade infinita de beleza. Beleza em dor. Que nenhum sentido literário ou estético é capaz de dissimular. Sei que queres alegria e celebração. Queres vida a brotar pela ponta dos dedos. Queres alegria a jorrar pelos olhos. Mas eu. Eu nem sequer sei como sorrir agora. Os meus dedos estão fechados sobre as mãos. Não têm forma de produção. Os meus olhos estão fechados para qualquer cor. E tudo o que sinto é esta escuridão. Dentro. Funda. Que me absorve. Que me anula.

Como sentir este momento agora?
Que sentido fazem as palavras quando nem a elas se bastam. Impossíveis de entender. E este medo que cresce. Que não pára. Porque é noite. Porque foi o absurdo que tomou o lugar. E tudo então parou. E o amanhã parece um lugar demasiado distante. Por sem ti. E eu só procuro um sentido. Uma ponta de luz por dentro do peito. Cada vez mais cansado. Do teu não respirar.

Aporto o meu barco.
O universo inteiro é agora uma tempestade infinita de beleza.
E nele tu.
A estrela maior.