sábado, maio 20, 2023

CHEGAS

Esta manhã um pássaro passou. Quase longe. Voava alheio aos teus olhos. Como eu não consigo. (como eu nunca irei conseguir). E no seu voar, senti de perto o teu respirar. Peito oscilante. Realidade dos dias. E mais de perto ainda, esta fome permanente que tenho do beijo da tua boca. Em desejo. Permanente (in)satisfação. E como quem ama as palavras como a um corpo, escrevo-te. Acaricio as sílabas. Deixo que as pontuações sejam topos, e que nelas se abram portas de regresso a esse lago. Ao lugar onde és. E existimos.


Um pouco mais e será noite. Fecha os olhos e sossega. Larga as desventuras à porta do meu corpo e escuta o silêncio. Porque eu quero amar-te na palavra e no corpo. Ser o contrário de tudo o que não é de nós. E na impaciência do teu corpo, cantar-te de dentro de mim o teu nome à boca do ouvido. Enquanto te digo como um segredo, que te Amo. O quanto te Amo. E olhar-te. Olhar-te na dança e no adormecer das pálpebras. E ficar a ver-te dormir. Enquanto os beijos ainda todos na minha boca. Os sulcos das tuas unhas ainda todos na minha pele. O teu odor ainda em todos os meus poros. E ainda com todos eles, numa carícia de olhar, ansiar pelo beijo do acordar. E por isso chamar-te. Uma vez. Duas vezes. Tantas vezes, para dentro de mim. Para que não acordes. Para o mundo não te levar.

Hoje chegaste no voo do pássaro. Ontem foste brisa, som ou odor.
Nunca sei como me vais chegar. Mas todos os dias te espero.
E em todos chegas.

E nunca mais o vazio.
Em mim.

Sem comentários: